Notas introdutórias sobre o Género Aplocheilus (Mc Clelland, 1839)

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Artigo publicado no Boletim da Associação Portuguesa de Killifilia Vol. II, nº2 Mar./Abr. 2000

Por: Alberto Reis

O Género Aplocheilus abrange 6 espécies: blockii, dayi (dayi dayi e dayi werneri), kirchmayeri, lineatus, panchax (panchax panchax e panchax siamensis) e parvus.

Habitam uma razoável superfície do Sudeste Asiático (Índia, Sri Lanka, Paquistão, Malásia, Bangla Desh, Birmânia e Tailândia) e Indonésia.

Na sua área de distribuição só existe outro Género de killies: Oryzias.

São peixes não anuais que habitam rios e riachos sem corrente ou com corrente fraca, águas estagnadas e arrozais, geralmente com muita vegetação submersa e flutuante. Em comum o facto de viverem em águas pouco profundas e sempre próximos da superfície. De dimensões típicas entre os 5 e 9 centímetros, existe um representante com maiores dimensões, até 12 cm, o Apl. lineatus.

Os killies deste género foram mantidos em aquário com alguma frequência, tendo tido alguma popularidade há já algumas décadas. O facto de não apresentarem as cores exuberantes dos Aphyosemion e Nothobranchius, nem a beleza das barbatanas de muitas Cynolebias fez com que a sua manutenção entre os killiófilos apresente agora um período de menor fulgor. Estas linhas tentarão justificar porque é que são um dos meus géneros preferidos, que tento manter nos meus aquários comunitários.

O nome Aplocheilus vem do grego e significa “lábios finos”. As semelhanças de morfologia e hábitos entre estes dois géneros fez com que reconhecidos especialistas tais o holandês Ruud Wildekamp os considerem como um género comum.

A boca largada e virada para cima, o dorso e o focinho plano mas a terminar em ponta denotam uma posição próxima da superfície e uma alimentação baseada em insectos que caem na água. No entanto poderão ocasionalmente alimentar-se de peixes que caibam na sua boca relativamente grande em relação ao tamanho do corpo. Há neste comportamento de predador acidental e na morfologia algumas semelhanças com um peixe que habita as nossas águas doces do interior e que já tive o privilégio de pescar em Espanha: o lúcio (Esox lucius).

O dimorfismo sexual é pouco marcado comparativamente com outros killies. Os machos atingem ligeiramente um tamanho maior e cores um pouco mais intensas e contrastadas. O padrão de riscas e/ou pontos pode ser diferente.

As plantas flutuantes são vivamente recomendadas pelas sombras que proporcionam, e nessas condições os Aplocheilus apresentam-se menos tímidos. Ao contrário de muitos Epiplatys, não perdoam uma refeição constituída pelos seus próprios alevins que só estarão a salvo quando atingem um comprimento razoável (mais ou menos 3 cm). Aliás, tudo o que caiba na sua boca e se mova, é deglutido, muitas vezes com sofreguidão. E a sua elevada velocidade de ponta não dá hipóteses à concorrência. São corredores de curta distância, tipo “chita” de aquário. São os primeiros a chegar à comida, onde quer que ela se encontre. Mas fora da hora das refeições são geralmente indolentes, permanecendo em repouso ou deslocando-se muito vagarosamente perto da superfície. Às vezes exibem alguma agressividade intraespecífica (com os elementos da mesma espécie) com deslocamentos intimidatórios mas nunca presenciei até à data confrontos físicos directos. Quanto ao comportamento interespecífico, nada a assinalar, ignorando os restantes habitantes do aquário.

Os Aplocheilus, à semelhança dos Epiplatys apresentam características muito atraentes como peixes de aquário e pouco comuns à maioria dos killies. Podem ser excelentes peixes para aquários comunitários, habitando as camadas superficiais da água e em nada interferindo com habitantes de meia-água tais como os Caracídeos ou do fundo com os Ciclídeos. Podem ser habituados a uma grande variedade de comida congelada e seca e toleram jejuns relativamente grandes tais como duas semanas, o que os torna adequados para killiófilos que se ausentem com alguma regularidade das suas casas. São robustos, raramente contraindo as doenças mais habituais dos killies tais como o Oodinium. Este Género é dos mais robustos entre os killies. A facilidade de manutenção só é comparável aos Epiplatys e a algumas Cynolebias mais fáceis (as de clima temperado).

As temperaturas a que devem ser mantidos devem respeitar o biótopo da sua proveniência. O óptimo encontra-se no intervalo entre os 24ºC. e os 28ºC mas podem viver sem problemas a temperaturas mais elevadas, bem acima dos 30ºC. se necessário. Podem tolerar temperaturas relativamente baixas, perto dos 20ºC se a isso forem obrigados. Toleram uma vasta gama de características da água, se bem que têm marcada preferência pela água ácida (pH 6 a 7) e relativamente macia (dH 4º a 10º).

A sua reprodução é simples e muito acessível ao iniciado. É um género bastante prolífico. Os seus representantes desovam geralmente perto da superfície e os ovos aderem preferencialmente às plantas aquáticas flutuantes. Os ovos, de dimensões apreciáveis, desenvolvem-se aproximadamente em duas semanas às temperaturas habituais de aquário. O método, para mim o preferido, é a da introdução de ninhos artificiais flutuantes feitos em fibra acrílica (mops) no aquário onde se encontram os pais, mesmo sendo comunitário. A escolha da côr da fibra é importante no momento de inspeccionar os ovos que entretanto, se tenham aí depositado. O objectivo é criar contraste entre os ovos (transparentes ou translúcidos) e o substrato de postura. A côr que se tem revelado mais promissora é o castanho escuro.

Os mops devem ser retirados todas as semanas, inspeccionados cuidadosamente, de preferência através de luz intensa (por exemplo, num candeeiro de estirador) e os ovos devem ser removidos suavemente com a mão e colocados num recipiente de incubação. Eu prefiro a chamada caixa de Petri, em vidro. A sua elevada razão área/volume e transparência fazem com que os ovos estejam bem separados e facilmente visualizados todos os dias. Se houver algum ovos não fecundado ou contaminado por fungos (nesse caso fica opaco), deve ser removido imediatamente para não contaminar os restantes.

Já tenho incubado os ovos em água nova, sem cloro, e em turfa muito húmida (grau 5 na escala de Langton). Este último suporte apresenta algumas vantagens. Sincroniza melhor a data de eclosão principalmente quando as datas das posturas estão desfasadas e é o meio por excelência para enviar ovos por correio.

Os alevins de Aplocheilus são geralmente grandes o que lhes permite a alimentação com nauplios de artémia.

Quando se tem o cuidado de separar os pais antes de uma postura, e se alimentam substancialmente com comida viva e variada, o nº de ovos aumenta substancialmente. Já tive a sorte de recolher mais de 50 ovos semanais a partir de 1 casal de Aplocheilus lineatus.

A única dificuldade entre os Aplocheilus é a relativa lentidão com que crescem. O tamanho máximo só se atinge ao fim de um ano, e isso, nas melhores condições (renovações parciais de água frequentes, alimentação abundante e variada e espaço suficiente).

Outro senão: a sua elevada propensão para o salto, principalmente na captura de insectos no ar. E faz com que se devam ter redobrados cuidados quando se pretende a sua manutenção em aquário. Uma tampa mal fechada ou, às vezes, um pequeno orifício mal vedado tem consequências muito graves e irreparáveis: peixes a jazer mortos no soalho ou na alcatifa…Neste comportamento assemelham-se aos Aphyosemion, aos Epiplatys e aos Rivulus.

Os killies deste género muito raramente se encontram à venda nas lojas de aquariofilia, talvez à excepção do Apl. Lineatus e do Apl. dayi werneri, os quais já mantive e reproduzi.